Atraídos pela escassez de mão-de-obra qualificada, brasileiros com alto nível de instrução estão, cada vez mais, migrando para Europa e América do Norte. O fenômeno, chamado de fuga de cérebros, fica claro na análise de dois dados:
1) De 1996 a 2006, o número de brasileiros que receberam visto dos Estados Unidos dado somente a profissionais de alta qualificação aumentou 185%. 2) De 1990 a 2000, quase dobrou -de 1,7% para 3,3%-- a proporção de brasileiros com nível superior vivendo nos 30 países da OCDE, que reúne, na maioria, nações ricas de Europa, Ásia e América do Norte.
O Brasil não é o único afetado pela tendência. É a Índia o país com maior número de vistos dos EUA para trabalhadores qualificados, mas são nações de pequeno porte --como Guiana, Jamaica ou Haiti- que têm proporção de população com nível superior vivendo em outros países superior a 80%.
Mesmo assim, o aumento da fuga de cérebros do Brasil preocupa e muda o perfil do emigrante. Franklin Goza, professor da Universidade Estadual de Bowling Green (Ohio) que estuda a imigração brasileira para os EUA, afirma que ela está em transição.
"Nos anos 80, a vasta maioria de brasileiros que vinha para cá entrava ilegalmente, tinha baixa qualificação ou eram profissionais que chegavam como turistas, mas acabavam estendendo a estadia e trabalhando sem permissão em empregos não condizentes com sua formação, como professores lavando prato em restaurantes."
Hoje, no entanto, ele define a migração brasileira para lá como bi-modal. O fluxo de ilegais ainda é grande --no ano passado, os brasileiros perderam apenas para os mexicanos entre os que foram apreendidos na fronteira-, mas cresceu significativamente o número de profissionais em situação legal.
No Brasil, os efeitos também já são identificáveis. Para o demógrafo Eduardo Rios-Neto, presidente da Comissão Nacional de População e Desenvolvimento, o principal problema é a escassez de recursos humanos de alta qualidade no Brasil e no mundo.
"O Brasil fornece talentos para esse mercado global. O ponto é saber se é benéfico ou deletério. Se o trabalhador tiver estudado numa universidade pública, é deletério, pois foi o Estado que subsidiou sua educação. Mas, se a tendência é inexorável, há que se desenhar arranjos institucionais, como retornos periódicos e transferências de tecnologia, para minimizar as perdas."
O demógrafo, no entanto, enxerga oportunidades: "Há risco de longo prazo de que a classe média seja insuficiente para prover toda a demanda por qualificação do país. Com isso, pela primeira vez a elite empresarial terá de investir na educação popular como prioridade e devido a interesse econômico, e não por altruísmo."
ANTÔNIO GOIS da Folha de S.Paulo, no Rio
DENYSE GODOY da Folha de S.Paulo, em Nova York